Do trânsito caótico à cidade conectada, urbanidade em conflito: quando o caminho se torna uma barreira
Por Felipe Gonzaga de Sousa (Acadêmico de Arquitetura e Urbanismo da FASC)
A relação entre mobilidade urbana, gentrificação, arquitetura hostil e o direito à cidade é um assunto de crescente importância nas discussões sobre o desenvolvimento urbano. À medida que as cidades crescem e se transformam, os cidadãos enfrentam desafios significativos relacionados ao acesso à cidade e à sua participação na vida urbana. Neste artigo, examinaremos esses quatro elementos e exploraremos suas interconexões.
A mobilidade urbana, o “coração da cidade”, desempenha um papel central no funcionamento de qualquer cidade. O acesso eficaz ao transporte público e alternativas de locomoção não permite apenas a circulação das pessoas, mas também influencia diretamente a acessibilidade e a inclusão social. Em muitas cidades, no entanto, sistemas de transporte ineficazes e superlotados criam barreiras para os cidadãos.
Já na ação transformadora de bairros e comunidades, a gentrificação, por outro lado, é uma força poderosa que reconfigura espaços habitacionais inteiros. Embora possa trazer melhorias visíveis para algumas áreas urbanas, muitas vezes leva ao aumento dos custos de moradia e o próprio custo de vida pela supervalorização do local, forçando os moradores de baixa renda a deixarem suas casas. Isso tem impactos profundos na composição demográfica e na coesão social das comunidades afetadas, tendo como consequência a periferização ou até mesmo colocando esses habitantes em situação de rua.
Na sequência, arquitetura hostil se refere a elementos físicos e projetos urbanos que excluem ou dissuadem a presença de certos grupos de pessoas, como sem-teto. Exemplos incluem bancos de parques específicos para evitar que as pessoas durmam neles. Esses recursos são direcionados para a segregação social e para a falta de inclusão nos espaços públicos, trazendo divisórias estratégicas, iluminação específica e paisagismo peculiar, visando a direcionar e a moldar como as pessoas devem utilizar o espaço, direcionado a grupos que incluem indivíduos em situação de rua e ambulantes.
No ano de 2021, o padre Júlio Lancellotti protagonizou a cena com a quebra de pedras instaladas em um viaduto pela prefeitura de São Paulo. Logo após, no final do ano de 2022 foi criada a Lei Padre Júlio Lancellotti, que proíbe a arquitetura hostil, a qual não permite o uso de materiais e estruturas projetadas para afastar pessoas sem moradia fixa em locais públicos, mostrando que nem toda arquitetura está alinhada ao bem-estar e ao conforto dos seres humanos.
Ademais, o direito à cidade é um conceito que se refere ao acesso equitativo à cidade e à participação na sua vida cultural, econômica e política. A mobilidade urbana eficaz, a prevenção da transformação descontrolada e a criação de espaços públicos inclusivos são todos componentes essenciais do direito à cidade. É um princípio fundamental que visa a garantir que todos os cidadãos possam usufruir plenamente do ambiente urbano bem planejado e funcional. Porém, quando colocado em prática, pode-se analisar que esse privilégio não está inerente a todo cidadão brasileiro. Aporofobia (aversão a pobre) este é o nome dado a esse conceito de afastar as classes mais baixas de uma classe elitista economicamente mais favorecida de uma cidade. Tal flagelo sempre assolou a sociedade brasileira.
Dessa forma, conclui-se que a interligação entre mobilidade urbana, gentrificação, arquitetura hostil e o direito à cidade é evidente. Para construir cidades verdadeiramente inclusivas e sustentáveis, é fundamental que as políticas urbanas e o planejamento urbano considerem esses elementos em conjunto. Isso requer esforços significativos para melhorar o transporte público, regular a reabilitação, criar espaços públicos acolhedores e promover a participação ativa dos cidadãos na vida da cidade.
Em resumo, o desafio da mobilidade urbana, gentrificação, arquitetura hostil e direito à cidade não pode ser abordado isoladamente. Esses elementos estão interligados e têm um impacto profundo na qualidade de vida dos habitantes urbanos. Portanto, uma busca por cidades mais justas e inclusivas deve considerar esses quatro pilares do desenvolvimento urbano como parte de um todo integrado.
A promoção de cidades inclusivas requer uma abordagem multifacetada que leve em consideração a interconexão entre essas problemáticas. A compreensão de que esses elementos formam um quadro complexo é fundamental. Para que as cidades alcancem verdadeiramente inclusão, é necessário adotar políticas de mobilidade que priorizem o acesso equitativo a todas as partes da cidade, compensar o design urbano para torná-lo acolhedor e acessível a todos e garantir que o direito à cidade seja respeitado por todos os seus habitantes. Isso não apenas melhora a qualidade de vida, mas também fortalece o tecido social e econômico das cidades, promovendo um ambiente mais justo e igualitário para todos.
*Texto produzido na disciplina Leitura e Produção Textual ministrada pelo professor José Roberto Duarte